quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Conclusões de um eremita


"Se hoje brigo comigo é porque misturei-me demais aos outros."


sábado, 13 de dezembro de 2008

O Toque


Ela acordou sentindo-se diferente, apesar de não saber dizer o que, algo nela havia mudado, mas num bom sentido. Talvez porque tenha dormido bem, ou pela ensolarada manhã de domingo, ou talvez pela viagem de trem.
Ela sempre achou os trens incrivelmente românticos, mesmo estes trens modernos que em nada se parecem com as antigas e inspiradoras marias-fumaça.
Parada final: Jundiaí.
Se lembrou da brincadeira com a qual sempre provocava a amiga de lá:
- Muito gostoso ir para o interior de trem!
- Que interior menina? Desde quando Jundiaí é interior?
Oito e meia da manhã, a garota um tanto entusiasmada, um tanto introspectiva deixava São Paulo ainda dormindo, rumo ao clima quase bucólico da pequena cidade vizinha, perguntando-se se chegaria muito tarde para o encontro com a amiga.
Desembarcou do primeiro trem dirigindo-se diretamente à plataforma 2.
O segundo trem é mais encardido, os bancos menos confortáveis. O incômodo do desconforto a afasta ainda mais da atmosfera da metrópole, é curioso que isto acentue sua paixão por viagens de trem.
Apesar de não se imaginar vivendo em outro lugar, ela definitivamente não gosta de São Paulo e quando alguém a questiona sobre o motivo, ela costuma responder que é por causa do frio.
Embarcou assim meio desorientada, com o pensamento longe e sentou-se no primeiro banco disponível. Procurou alguma coisa na bolsa, em seguida sacou um livro.
Abriu bem na página marcada, onde havia uma dedicatória:
“Amor,
ainda que se sinta perdida em meio a multidão de estátuas de mármore
e o frio da tarde chuvosa atresse sua pele cortando-lhe o corpo,
mesmo que cercada de um punhado infinito de formas metálicas e de gigantescas muralhas de vidro
que a fazem sentir cada vez mais gelada,
lembre-se das palavras do poeta:
'O amor é o fogo que arde sem se ver'
E então feche os olhos e sinta: eu estou te tocando.
Num toque quente, sinta seu rosto entre minhas mãos, olhe-me nos olhos.
Veja-me face a face, como nos teus sonhos.
Eu serei sempre o rosto humano em meio as incontáveis faces de mármore.
Eu serei sempre o calor do fogo que te aquece em todos os teus dias.
E saiba que enquanto eu respirar, não faltará a ti o que falta a estes habitantes de andar robótico na terra do metal e do vidro: o toque.”
Fechou o livro deixando cair as folhas umas sobre as outras acompanhando a lágrima teimosa que caía sobre a sua face corada. Estava nervosa, não queria que as pessoas percebessem seu choro.
Enxugando os olhos, ela se concentrou na difícil tarefa de pensar em qualquer coisa que não lembrasse o ex. Não conseguiu. Levantou a cabeça e olhou ao redor para se certificar de que ninguém havia notado aquela lágrima que deixara cair.
Como havia imaginado, ninguém percebeu.
“Não se sinta fria em meio à multidão de estátuas de mármore.”
Novamente sentiu vontade de chorar, mas dessa vez segurou. Mais uma vez percorreu o vagão com os olhos, foi então que viu do outro lado, bem no canto, um garoto moreno, comum, um tanto tímido mas seu rosto não era como os outros, ele a encarava, ou melhor, ele era o único ali que a percebia.
Eles permaneceram alguns instantes assim, se olhando.
Ele fez menção de se levantar, não pensou, apenas caminhou em direção a ela.
Enquanto o garoto desconhecido andava em sua direção, ela pôde perceber em suas mãos algo que logo em seguida julgou ser um DVD, leu o título:
“Antes do pôr do sol”
Viagens de trem são mesmo muito românticas, pensou.
Ele se sentou no banco vazio ao lado dela, olhando-a nos olhos. E assim sem dizer nada, seus dedos foram tocando os dela...
A garota sentiu-se estranhamente completa. Ela nem se quer estava mais gelada.
Apenas um pensamento ecoava, insistente, em sua cabeça:
“O que falta às pessoas é o toque.”
Acordou meio sobressaltada com o trem chegando à estação, fechou o livro e desceu dirigindo-se ao encontro da amiga.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008


Lá pelas sete o sol nasceu para mim. Era um novo dia, uma nova manhã.
O cheiro da manhã é de liberdade.
E o coração batia pela primeira vez neste novo dia. (Luz) agora posso ver novamente meu rosto no espelho...
Um segundo rosto. O sol iluminou a face dele em diagonal. E o corpo iluminado transfigurou-se em corpo luminoso.
O cheiro da luz é de liberdade.
Abro a janela do quarto e, logo ali, voando baixinho num céu azul turquesa antes nunca visto, um solitário pássaro branco. E agora descubro o quanto é frágil minha normalidade muda. Patológico?
Descubro agora que não sou boa o bastante. Que minha vida não é boa o bastante.
Fecho a janela.
O vôo do pássaro termina cedo. Às seis o sol já está se pondo.
Estou com sede, vou até a cozinha. Mas a cozinha não resolve, pois minha sede é de conceitos.
Os conceitos, as cozinhas, tudo é tão perecível e eu nem se quer preciso disso. Dessa água não. Não beberei. Mas estou com sede. Enquanto ouço uma voz lá dentro falando de preconceito. O Pré - conceito vem antes. Patológico? É dessa fonte que bebemos.
A tristeza vem antes da felicidade.
Na verdade nunca se sabe o que vem depois.
Parece fácil. Depois do Pré, o Pós. Depois da manhã, a tarde, depois da tarde, a noite. Depois da vida...
Ontem à noite eu tive um sonho. Sonhei que a porta se abriu e era exatamente quem eu esperava. Sonhei que o pássaro branco entrou pela janela e trouxe a luz da manhã. O corpo iluminado, transfigurou-se em fonte de luz.
E eu sonhei e só. Depois do Pré, o Pós. Depois do sonho, a realidade.
Na verdade a gente nunca sabe o que vem antes e o que vem depois.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Oh My God, He Is Black!


Em primeiro de janeiro de 2003, aqui no Brasil, um metalúrgico de São Bernardo do Campo assumia a presidência da República. Exceto pela queda da ditadura e pelas eleições diretas, podemos dizer que esta foi a maior conquista sócio-política da história nacional moderna, onde toda a sociedade brasileira pôde assistir a classe trabalhadora, vítima de inúmeras repressões e humilhações ao longo dos tempos, subir ao poder.
Quase seis anos depois. Eu e o mundo inteiro pudemos ver, embora muitos ainda não acreditassem, um negro ser eleito presidente de um país que, além de ser a maior potência mundial e, portanto, berço da hegemonia burguesa, é conhecido como uma nação tradicionalmente racista em que, entre outras coisas, brancos e negros são separados por bairros.
Mais do que uma questão de preferência partidária como a mídia veicula, o que o mundo inteiro assistiu ontem, assim como o Brasil assistiu há seis anos, foi o grito desesperado das chamadas “minorias” (o que sabemos que não são...), um impetuoso grito de libertação, um grito sufocado há séculos e que há muito ameaçava soar.
Os EUA, no dia 04 de novembro de 2008 gritou por mudança. Nós brasileiros fizemos o mesmo quando fomos às urnas e elegemos Lula como presidente. Esta analogia entre a história destes dois homens, como eleitos de duas sociedades insatisfeitas e suplicantes por mudança em muitos aspectos pode parecer ingênua e utópica, pois, de certa forma, subestima os vários outros fatores, além da questão classista, que estão envolvidos nestas duas eleições e suas possíveis deficiências, mas espero não estar sendo exagerada em dizer que elas refletem uma nova sociedade, novas demandas sociais, e que esta “nova sociedade” tanto mais se renovará quanto mais suas ações tomarem grandes proporções, nesta medida, a eleição de um presidente negro nos Estados Unidos implica numa mudança que já está ocorrendo, mas que agora toma proporções mundiais, em outras palavras, o que quero dizer é que esta eleição muda, em alguma medida, toda a história da humanidade, e que assim seja.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Parto-me


As amarras ferem cada vez mais
Os pulsos sangram hemorragicamente,
Enquanto estas pesadas mãos em minha boca
sufocam o grito!
Preciso encontrar a válvula,
Senão a panela explode!
Deixa sair o ar, devagar...
Deixa sair o ar.
Deixar escapar a pressão
Deixo.
Não!
Bum!
Vai ao ar
Perco as rédeas de mim
Cavalo alado, atinge as nuvens
E quando volta ao chão
Já não é mais o mesmo
Pois agora conhece os perigos dos céus.
Quando volto ao chão, estou nudado, estou perdido

Leve-me de volta para mim!

O relógio continua produzindo seus barulhentos tic-tac's
Depois...
O silêncio
E então o sono.
O tempo opera milagres.
O tempo conserta.
Será?
De volta ao controle
A panela vai ao fogo "como antes"
E então?
...Pressão...
A pressão nunca pára
Ou pára, mas só quando o fogo apaga
Por ora a chama está alta,
pelos menos até onde os olhos enxergam
E se a válvula não estiver boa?
Cuidado!
A panela explode...
Bum!

"Leve-me de volta para mim".

terça-feira, 28 de outubro de 2008

De volta pra casa


O problema é o seu único amigo e ele está de volta novamente

Faz seu corpo parecer mais velho do que realmente é
E ela diz que está tarde e precisa ir
Não temos muito o que dizer nesse momento
O problema é o único caminho para a tristeza.
Tão forte como você era
Carrego você
Estou vendo que você respira...
Pela última vez
Uma canção para seu coração
E quando ele está tranquilo
Sei o que significa
Se ela tivesse asas, voaria para longe
E algum dia sei que Deus lhe dará.
O problema é o único caminho para a tristeza.
Tão forte como você era
Carrego você
Estou vendo que você respira...
Pela última vez
Uma canção para seu coração
E quando ele está tranquilo
sei o que significa
Eu vou levar você para casa
Eu vou levar você para casa
Todos querem ver a beleza das
luzes da cidade de Nova York.
E os verões foram tirados do mundo da garotinha
Esta noite
Carrego você
Estou vendo que você respira...
Pela última vez
Tão forte como você era
Carrego você
Estou vendo que você respira...
Pela última vez
E eu vou levar você para casa
Eu vou levar você para casa

(Carry You Home, James Blunt)

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Parceria inteligente


Livro Chip de Raduan Nassar contém trilha sonora d'O Teatro Mágico!

"Extraído do Site Oficial do T.M."


O grupo O Teatro Mágico e o escritor Raduan Nassar acabam de lançar na web um mini-documentário sobre a vida do autor, totalmente musicado pela banda que une circo e música.

Raduan Nassar assina textos célebres da literatura como "Lavoura Arcaica" e "Um Copo de Cólera". Não deixem de conferir o vídeo que retrata sua trajetória até as letras e um breve prefácio virtual de seu livro "Menina a Caminho" com trilha de Anitelli e trupe.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

E eu sonhei...


Risadas.

-É claro que eu não vou contar pra vocês, meninas.
-Ah não? Por quê?
-Sonhos não são projeções do inconsciente? Acham que vou me entregar desse jeito?
- Agora a nova onda é Psicanálise? Semana retrasada o dircurso eram as amarras do condicionamento, a falta de liberdade. Semana passada a segregação, as injustiças presentes no campo...
- E agora, oras, tudo culpa do complexo de Édipo! Tudo para mim agora faz sentido.
- O que faz sentido?
- Tudo.
- Você tá tentando mudar de assunto... vai conta, o que você sonhou?
- Sonhei com um encontro.
- Huuuuuum... E que encontro era esse?
- Se parecia com o meu pai, mas aos poucos, ele foi desaparecendo, virou fumaça. E então, diante de mim estava eu mesma. O resto, não posso contar, tem a ver com alguém que vocês conhecem...

E era ele. Não o beijei. Não aconteceu nada. Nem dormindo nem acordada. E eram três, passado, presente e, quem sabe, futuro.

terça-feira, 30 de setembro de 2008

Só mais um... (grito!)

*Sufocado. O mais fraco soluço do mais fraco.*

Nós pequenos
Que vivemos à sombra de gigantes
Sofremos pela imperfeição
que são os filhos de Deus
Graças à Eva tudo é como é
Será?
É fácil culpar os outros
E abster-se de toda a responsabilidade
E assim caminha a humanidade,
Ouvindo os ecos (des)ordenados
Da classe superior:
Preto quando não caga na entrada, caga na saída
E os brancos, não cagam?
No mínimo são entupidos

Esses estúpidos
Só não vê aquele que não quer

Eu não sou uma máquina,
Falhar é inevitável
Perfeição?
Deixe de querer ser deus
Você não é.

Deixe de querer possuir o controle de tudo.
Me diga por que estou tão triste.

A culpa é de quem?
Repressão?
Opressão?
Outro dia me perguntaram a diferença,
Nem pensei, respondi: que importa?
Sufocação!
A pior cobrança começa dentro.
Estas correntes envolvem o meu corpo
E não me deixam viver plenamente.
Estes parafusos em meu sorriso
Imitam uma certa felicidade.
Só é feliz aquele que é livre!
Eu, ainda menino, ouvia ao fundo as palavras da catequista:
Sua liberdade termina onde começa a do próximo.
Mas que liberdade é essa?
Eu não conheço.
E dou um beijo em quem disser que é livre.
Estranho é ver as pessoas buscando felicidade
No meio de tanta sujeira
Os ricos são felizes?
Minha mãe tem nojo do dinheiro.
O ditado diz:
Dinheiro não traz felicidade, mas compra.
Ouça. mais ecos...
...Ignorância...

Sempre vem de baixo?
Enquanto isso, crianças tocam violão no pátio
E cantam uma canção qualquer
É lindo ver a esperança
Que há na juventude
Jovem e cheia de vida!
Feliz?
Lá vem a inspetora.
“Vocês não podem cantar aqui,
estão atrapalhando a aula.”


Escrito em Janeiro de 2008

terça-feira, 23 de setembro de 2008

A vida é um espelho de mentiras


Pra falar a verdade às vezes minto
Tentando ser metade do inteiro que eu sinto
Pra dizer às vezes que às vezes não digo
Sou capaz de fazer da minha briga meu abrigo
"Tanto faz" não satisfaz o que preciso
Além do mais quem busca nunca é indeciso
Eu busquei quem sou
Você pra mim mostrou
Que eu não sou sozinha nesse mundo.

Basta as penas que eu mesma sinto de mim
Junto todas, crio asas, viro querubim
Sou da cor do tom, sabor e som que quiser ouvir
Sou calor, clarão e escuridão que te faz dormir
Quero mais, quero a paz que me prometeu
Volto atrás se voltar atrás assim como eu.
Busquei quem sou
Você pra mim mostrou
Que eu não estou sozinha nesse mundo.

Cuida de mim enquanto não me esqueço de você
Cuida de mim enquanto finjo que sou quem eu queria ser.
Cuida de mim enquanto não me esqueço de você
Cuida de mim enquanto finjo... Enquanto fujo...
(Cuida de mim, Fernando Anitelli)

A verdade é que, incapazes de cuidar de nós mesmos, estamos sempre em busca de quem o faça pra gente.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Madrugada Plim Plim


Os anos 80 e 90 foram, sem dúvida, grandes marcos na história do cinema mundial. Com o calcanhar nos roteiros inteligentes dos preto e branco e a ponta dos pés nos efeitos especiais, a indústria cinematográfica asiática, francesa e principalmente norte americana, produziram centenas de grandes obras.
No Brasil o cenário era, literalmente, outro: o cinema nacional começava a dar seus primeiros passos rumo ao reconhecimento internacional.
Bem, o fato é que, com ou sem grandes investimentos, estas décadas foram tão significativas que romperam fronteiras, porém é impossível negar a hegemonia hollywoodiana em termos de produção cinematográfica.
Não deixo de tirar o chapéu para produções milionárias, mas esta está longe de ser uma questão essencial. É possível se fazer um ótimo filme com muito menos, aliás a simplicidade é o que muitas vezes traz o charme para a produção. E quando digo simplicidade, me refiro a roteiros "trabalhados", sem grandes firulas e com um olhar para questões inerentes ao ser humano, onde é possível "ousar", trazendo temas que possibilitem a identificação do público através do clima lúdico da ficção e da fronteira tênue que esta demarca com a realidade. Uma direção de arte que explore mais a natureza das coisas e das pessoas do que se preocupe com saltos estilo Matrix ou náufragos a la Titanic. Um diretor que preze por grandes atuações seja no drama, na comédia ou na ação.
E já que afirmo que grandes obras não implicam necessariamente em grandes investimentos e em roteiros complexos, vou vender o peixe da Sessão Corujão.
Alguns dos melhores filmes que já assisti foram nas madrugadas das líderes de audiência, e dentre eles, há alguns dos quais eu nem se quer lembro o nome e que dificilmente eu vá ver de novo.
Dos que me lembro e já procurei que nem doida, em tentativas fracassadas, estão Silver Strand e Threesome (os títulos originais são mais charmosos), se você tiver sorte de encontrar, assista, eu recomendo.
Sabe que até hoje me pergunto por que filmes bons passam tão tarde?
Na verdade, a resposta é simples: o estilo Globo de televisão preza pelo capital, e os brockbusters da Tela Quente são os que atraem o grande público e é tudo o que eles querem. Filme inédito, boa audiência; boa audiência, massificação cultural; massificação cultural, padrão, padrão globo de manipulação. Um ciclo sem fim...

E veja como é irônico, justamente a TV aberta que é o único recurso em termos de acesso à informação e à cultura que chega até a maioria brutal dos brasileiros, se ocupa não de apresentar a diversidade de visões de mundo nas várias manifestações de cultura, mas de tornar padrão uma única visão de mundo; a do capital, e, portanto, das grandes produções.
O SBT segue a mesma linha, se já passa das duas da madrugada, vá correndo ligar a televisão no canal quatro antes que mudem a programação pela terceira vez no mês na tentativa de vencer a Globo.
Diante desta situação, o que me resta senão lamentar? Passar a noite acordada esperando pelos "filmes alternativos" que provavelmente não vou encontrar na locadora e muito raramente encontro para comprar?
Não. Com certeza não. Amanhã preciso acordar cedo para trabalhar, afinal não podemos sair do padrão. A ordem é o lucro, então, mãos à obra!
A torcida é para que eu seja acometida por uma crise de insônia, ligue a TV e seja aclamada com uma oportunidade única de assistir a uma dessas verdadeiras jóias do cinema.


quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Séria Demais


"A arte de escrever sem pensar”


Estive pensando...
meus textos são sérios demais.
Só tenho dezoito
e penso demais.
Penso.
É tudo tão atemporal,
até minha forma de pensar.
E a vida é uma ilusão.
Uma brincadeira
Onde cada momento se perde
na brevidade do piscar.
Quem dera meus olhos fossem as lentes de uma câmera
E que tudo, cada detalhe, ficasse registrado.
Quem dera a vida parasse para curtir o momento.
Quem sabe aquele tempo em que fui feliz (e não sabia)
não teria ido embora...
Mas quantas vezes fui feliz?
Todo dia, pelo menos uma vez.
E quando fecho os olhos,
lembro- me daquela poesia
Ou das palavras soltas pela sala
itinerante do museu da língua
Ou da voz suave daquele cantor
Ou do rodopiar da bailarina
Da conversa descompromissada com as amigas
Das risadas sem motivo
Ou das aulas de psicologia.
E se a vida parasse naquele momento
Em que seus olhos cheios de ternura
diziam que gostavam de mim?
E você, tremendo todo, pálido, parecia sincero
E pela primeira vez eu senti que podia ser amada.
E se a vida parasse no momento do primeiro beijo?
Ou no fim daquele filme que falou à alma,
Ou quando eu olhava para você?
E quem sabe a vida não parou, realmente...
Eu penso demais e sinto mais ainda
O mundo inteiro é feito de impressões digitais
E quanto mais escrevo e penso a vida,
mais percebo que o registro não se registra
A gente só sabe sentir.
Quem dera pudéssemos elevar
cognições à amplitude de sensações.
Pensamentos são apenas pensamentos.
Rabiscos na folha são apenas rabiscos.
E desisto, não dá para dividir com você
E vice – versa.
Escrever é sério demais.
Mas não desta vez...
E a frase vem à cabeça,
os dedos apenas correm pelo teclado sem pretensão alguma
E então assumo a minha idade.
Hoje escrevo, mas sem pensar.

*Escrito em 08 de Setembro


Ocorre-me agora:

A seriedade faz fronteira com o surto.

Todo excesso é patológico.

Um sopro esclarecedor ecoa em meus ouvidos...

"A vida não pode ser levada tão a sério"

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Traslado


* De Corpo e Alma*

Abnegação. Algumas pessoas nascem com sorte no amor, outras não. Parece ser muito complicado, mas não é.
A única vez em que tive a impressão de que tudo estava dando certo, foi também, e não por acaso, quando senti que tudo estava meio fora do prumo.
É algo tão intocável, incolor e inodoro que só se pode pensar que não é real.
E quando, finalmente, a cegueira da paixão decide nos deixar em paz, essa perfeição toda nos apresenta sua face deformada.
Enfim, não é exatamente disto que me proponho a falar, e sim sobre aquela tal “missão” que dizem motivar esta existência, na maioria das vezes, tão esvaziada de sentido. Pois bem, não se trata de uma hipótese. Trata-se de um fato. Há certas panelas que, por defeito de fabricação ou não, simplesmente vêm sem a tampa, o que não significa que elas não sirvam para cozinhar, e tampouco se deve forçar a elas tampas que não lhes sirvam.
Não sei se me faço clara, também nem era essa a intenção.
Acontece que sinto uma coisa, hoje, pela primeira vez.
Bem-estar. Abnegação.
É possível ser feliz amando, mesmo quando você parece não ter predisposição a isso. Ora, o amor se apresenta sob várias faces, formas, conteúdos, e amar é não esperar nada em troca, muito menos amor.
Quantas as formas de ser feliz e de se sentir útil que não necessariamente recaem sobre aquela eterna busca pelo outro que, de forma mascarada, nada mais é do que a busca por si mesmo, ou por aquilo que parece completar o que falta no eu?
Às vezes o caminho destinado a você é justamente o oposto. Resignação.
Quem sabe você sinta, como hoje pude sentir, a cálida paz diante dos estranhos no espelho e entenda que é preciso ter calma. A sabedoria é um engenho. E o reconhecimento dos estranhos pode, enfim, acontecer se aprendermos novas formas de buscar.
Quando os meus olhos procuram os teus e finalmente os encontra, posso ver, em sua íris, o reflexo de minha própria imagem. Quando ouço o que você tem a dizer é como se eu que falasse, quando chora, seguro o nó na garganta e não deixo a lágrima, que nasce teimosa no canto do olho, escapar. Não posso. O forte desta história sou eu. Assumo uma postura profissional e me mantenho como uma rocha.
Mas quando você sorri, meus lábios trêmulos não me obedecem mais, acabam por revelar meus dentes, esta sou eu e para sê-lo, aqui estou. Completa, enfim.
Dentre todas as formas de amar, resigno-me e só assim sou feliz.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Hoje não escrevo


Hoje faz exatos vinte dias que não publico nada novo. Precisava de um tempo para mim. Quando escrever deixa de ser um hobby para vestir a roupa da necessidade, sinal de que algo está errado. Desde que criei este blog, há apenas quatro meses, me deixei levar por mais um vício, e então passei a postar, quase sempre, duas vezes por semana. Esgota. A mim e a vocês.
Aproveito o ensejo para expressar minha sincera gratidão pelas mais de seiscentas visitas (tá, as minhas próprias visualizações de perfil não contam!), aos que comentam e aos que apenas lêem, para estes últimos devo dizer que o fato de lerem, por si só, é uma grande recompensa. E aos comentadores assíduos, saibam que é uma honra “ouvir” o que vocês têm a dizer.
O fato é que eu já não consigo mais ficar longe deste espaço por muito tempo.
Mas hoje não escrevo. Não sou eu quem fala hoje, me calo para, junto a vocês, ouvir as palavras deste gênio da linguagem e da metafísica (e quem sabe aprender com elas...).
E dedico meu silêncio aos leitores deste blog.


*A crônica se segue no próximo post.*

Chega um dia de falta de assunto. Ou, mais propriamente, de falta de apetite para os milhares de assuntos.

Escrever é triste. Impede a conjugação de tantos outros verbos. Os dedos sobre o teclado, as letras se reunindo com maior ou menor velocidade, mas com igual indiferença pelo que vão dizendo, enquanto lá fora a vida estoura não só em bombas como também em dádivas de toda natureza, inclusive a simples claridade da hora, vedada a você, que está de olho na maquininha. O mundo deixa de ser realidade quente para se reduzir a marginália, purê de palavras, reflexos no espelho (infiel) do dicionário.
O que você perde em viver, escrevinhando sobre a vida. Não apenas o sol, mas tudo que ele ilumina. Tudo que se faz sem você, porque com você não é possível contar. Você esperando que os outros vivam para depois comentá-los com a maior cara-de-pau (“com isenção de largo espectro”, como diria a bula, se seus escritos fossem produtos medicinais). Selecionando os retalhos de vida dos outros, para objeto de sua divagação descompromissada. Sereno. Superior. Divino. Sim, como se fosse deus, rei proprietário do universo, que escolhe para o seu jantar de notícias um terremoto, uma revolução, um adultério grego - às vezes nem isso, porque no painel imenso você escolhe só um besouro em campanha para verrumar a madeira. Sim, senhor, que importância a sua: sentado aí, camisa aberta, sandálias, ar condicionado, cafezinho, dando sua opinião sobre a angústia, a revolta, o ridículo, a maluquice dos homens. Esquecido de que é um deles.
Ah, você participa com palavras? Sua escrita - por hipótese - transforma a cara das coisas, há capítulos da História devidos à sua maneira de ajuntar substantivos, adjetivos, verbos? Mas foram os outros, crédulos, sugestionáveis, que fizeram o acontecimento. Isso de escrever O Capital é uma coisa, derrubar as estruturas, na raça, é outra. E nem sequer você escreveu O Capital. Não é todos os dias que se mete uma idéia na cabeça do próximo, por via gramatical. E a regra situa no mesmo saco escrever e abster-se. Vazio, antes e depois da operação.


Claro, você aprovou as valentes ações dos outros, sem se dar ao incômodo de praticá-las. Desaprovou as ações nefandas, e dispensou-se de corrigir-lhe os efeitos. Assim é fácil manter a consciência limpa. Eu queria ver sua consciência faiscando de limpeza é na ação, que costuma sujar os dedos e mais alguma coisa. Ao passo que, em sua protegida pessoa, eles apenas se tisnam quando é hora de mudar a fita no carretel.
E então vem o tédio. De Senhor dos Assuntos, passar a espectador enfastiado de espetáculo. Tantos fatos simultâneos e entrechocantes, o absurdo promovido a regra de jogo, excesso de vibração, dificuldade em abranger a cena com o simples par de olhos e uma fatigada atenção. Tudo se repete na linha do imprevisto, pois ao imprevisto sucede outro, num mecanismo de monotonia... explosiva. Na hora ingrata de escrever, como optar entre as variedades de insólito? E que dizer, que não seja invalidado pelo acontecimento de logo mais, ou de agora mesmo? Que sentir ou ruminar, se não nos concedem tempo para isso entre dois acontecimentos que desabam como meteoritos sobre a mesa? Nem sequer você pode lamentar-se pela incomodidade profissional. Não é redator de boletim político, não é comentarista internacional, colunista especializado, não precisa esgotar os temas, ver mais longe do que o comum, manter-se afiado como a boa peixeira pernambucana. Você é o marginal ameno, sem responsabilidade na instrução ou orientação do público, não há razão para aborrecer-se com os fatos e a leve obrigação de confeitá-los ou temperá-los à sua maneira. Que é isso, rapaz. Entretanto, aí está você, casmurro e indisposto para a tarefa de encher o papel de sinaizinhos pretos. Concluiu que não há assunto, quer dizer: que não há para você, porque ao assunto deve corresponder certo número de sinaizinhos, e você não sabe ir além disso, não corta de verdade a barriga da vida, não revolve os intestinos da vida, fica em sua cadeira, assuntando, assuntando...

Então hoje não tem crônica.


Carlos Drummond de Andrade

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

A construção primeira do eu


Do que eu sempre julguei que sabia e queria, restou algo que, inevitavelmente, seria o início de tudo que hoje penso que sei e que sou.
Quanto ao futuro, eu ainda temia estar errada...
Sorte é perceber que este "algo" é, indubitavelmente, o que me possibilita, hoje, dizer: eu nunca fui tão eu quanto sou agora, desde então.
Quanto ao futuro, ainda temo estar errada...



"O saber é um trabalho. Por ser um trabalho, é uma negação reflexionante, isto é, uma negação que, por sua própria força interna, transforma algo que lhe é externo, resistente e opaco. O saber é o trabalho para elevar à dimensão do conceito uma situação de não-saber, isto é, a experiência imediata cuja obscuridade pede o trabalho da clarificação. A obscuridade de uma experiência nada mais é senão seu caráter necessariamente indeterminado e o saber nada mais é senão o trabalho para determinar essa indeterminação, isto é, para torná-la inteligível. Só há saber quando a reflexão aceita o risco da indeterminação que a faz nascer, quando aceita o risco de não contar com garantias prévias e exteriores à própria experiência e à própria reflexão que a trabalha."

(Marilena Chauí, Cultura e Democracia)


terça-feira, 5 de agosto de 2008

Um voto pela expansão da lei seca.


Se beber não dirija...
E nem tente filosofar.

Ontem, voltando da faculdade, pude entender melhor, e na prática, o tipo de situação que provavelmente inspirou a autoria da expressão popular "filosofia de botequim".
Tarde da noite, a agitada rua do bairro parece mais cenário de filme de suspense, escura e pouquíssimo movimentada, as únicas pessoas que ainda estão acordadas são alguns bêbados na porta do bar, falando alto e intimidando quem passa sozinho e a pé.
O papo parece realmente interessante, pois há uma estridência espasmódica em suas vozes, mas pudera, nestas condições...
Ao passo que me aproximo, posso ouvir o discurso de um dos indivíduos, que diz:
"Na vida, só tem dois tipos de pessoas. Ou você é o jogador, ou é a bola. Um nasce para chutar, o outro, para ser chutado."
Continuo caminhando, cada vez mais depressa devido ao horário, mas agora, surpreendo-me chegando a uma conclusão:
É por essas e outras que o Brasil é o país do futebol.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Música sem preconceitos


Tenho passado por uma pequena fase de bloqueio criativo. Digo pequena porque espero que passe logo, pois apesar de ter vários textos não publicados, gostaria de algo novo neste espaço. A "tentativa" de crítica a seguir custou a ser escrita, portanto não esperem muito dela. Aproveito para registrar os meus sinceros agradecimentos aos leitores deste blog, são vocês que me impulsionam a continuar.

“Aqui estou na difícil missão de levar a você uma mensagem que possa ser como uma luz ou um mantra, nós não somos mais crianças. Um dia acontece, a gente tem que crescer, temos que encarar a ‘responsa’. Eu não deixei de achar graça nas coisas, simplesmente hoje eu quero ser levado a sério; as coisas mudam sempre, mas a vida não é só como eu espero.”


Por volta de quatro horas da tarde de terça-feira toca o celular, ainda no trabalho, eu, sem reconhecer o número no visor, atendo um tantinho intrigada.
- Alô.
- Marinha, sou eu, a Ná.
- Ah... oi Ná, tudo bem?
- Tudo. Marinha, será que você conseguiria sair mais cedo do trabalho amanhã?

*

Já passava das nove da noite, em plena quarta-feira. E a platéia, ansiosa devido às mais de duas horas de espera, entoava, em coro, seu apelo impaciente:

- Charlie Brown, Charlie Brown, Charlie Brown…

As luzes do palco, que já haviam sido apagadas há algum tempo, não eram índice de que o show fosse, finalmente, começar.
De súbito, ouve-se uma voz que, reconhecida imediatamente, causa ainda mais frisson:

- Que pressa é essa?

O show era resultado da promoção de uma famosa rádio de São Paulo. Duzentos felizardos aniversariantes e seus dois convidados iriam curtir Charlie Brown Jr., num evento exclusivo.
Confesso que, como grande parte das pessoas, tinha certo preconceito com relação à banda, mas é claro que eu não poderia recusar um convite desses. Primeiro, porque vinha da Ná, uma grande amiga, segundo, porque eu sabia que seria uma experiência legal, afinal não é todo dia que temos a oportunidade de ir a um show exclusivo e com tudo “na faixa”.
O surpreendente foi que eu gostei muito mais do que pensei que gostaria, e digo mais, a espera valeu a pena. Calma, explico.
A dois metros do palco não há quem não se emocione. Ponho minha mão no fogo como, até o mais devoto dos amigos cult que tenho, balançaria com a emoção de estar ali. E acredito que o principal motivo seja a sinceridade que os caras espiram. É nítida a crença que eles têm em seu próprio trabalho, e não poderia ser diferente, digo o porquê.
Havia ali, em torno de quatrocentos jovens que cresceram ouvindo suas músicas, que sabiam todas as letras de cor e que vibravam com a energia positiva em torno deles.
A questão aqui é bastante delicada, estamos falando de um público jovem, uma galera que curte um som que tenha a sua cara e o rock é o estilo musical que tem embalado jovens, de vários cantos do mundo, há mais de meio século.
Temos que encarar a ‘responsa’. Perceba como esta letra é verdadeira, de fato, as bandas de rock carregam a enorme responsabilidade de compor o cenário conturbado da adolescência e, além de falar aos jovens, devem ter a consciência de que é nessa fase que firmamos nosso caráter. E a música, sendo uma das ferramentas de expressão mais acessíveis à grande massa e elemento fundamental à vida das pessoas, participa, enquanto forma de arte, na formação da visão de mundo do público que a prestigia. Está aí a responsabilidade das bandas jovens.
E, a meu ver, Charlie Brown é exemplo. É claro que ninguém é obrigado a concordar, também sabemos que todo artista comete lá os seus deslizes. Mas o rock do Charlie Brown está explicitamente mais maduro e a maioria de suas letras pregam o amor. Ora, achando clichê ou não, qual é a outra solução que se vê em tempos difíceis como os nossos, senão o amor?
As músicas têm acompanhado a evolução da banda, ainda que a maioria dos fãs prefira “as antigas”, o que se percebe é que a batida rebelde com letra provocadora tem dado lugar à sons mais melodiosos e à letras com mensagens de paz. É fácil notar tal maturidade através da comparação de dois grandes hits, a idealista “Lugar ao sol”, de 2001 e a atual música de trabalho “Uma criança com o seu olhar”.

“Que bom viver, como é bom sonhar
E o que ficou pra trás passou e eu não me importei
Foi até melhor, tive que pensar em algo novo que fizesse sentido
Ainda vejo o mundo com os olhos de criança
Que só quer brincar e não tanta responsa
Mas a vida cobra sério e realmente não dá pra fugir
Livre pra poder sorrir, sim
Livre pra poder buscar o meu lugar ao sol”

“(...) nós não somos mais crianças
Um dia acontece, a gente tem que crescer
Temos que encarar a responsa
Eu não deixei de achar graça nas coisas
Simplesmente hoje eu quero ser levado a sério
As coisas mudam sempre, mas a vida não é só como eu espero
Existe um dom natural que todos temos
Nossas escolhas vão dizer pra onde iremos(...)
Armadilhas do tempo são como o vento
Levando as folhas para lugares distantes,
O meu pensamento é o mesmo que o seu
Mas hoje meu coração bate mais forte que antes”

Se repararmos bem, as duas músicas têm muito em comum, inclusive pelo som, tanto Lugar ao sol, quanto Uma criança com o seu olhar, são as mais melodiosas de seus respectivos álbuns. A proposta também é a mesma, porém na segunda, a luta pelos objetivos foi encarada de forma mais “pé no chão”, sem deixar de lado a identidade da banda, enquanto banda jovem.
O ardil de Chorão e companhia consiste em pregar o amor como a força que nos leva a lutar pelos sonhos, o amor pelo que se é, pelo que se faz, o amor pelas raízes e pelo esporte. O fato deles viverem isto é o que torna ainda mais fascinante e verdadeira a trajetória do grupo até aqui.
Nunca vou me esquecer do que vi e senti naquela noite. De certa forma, posso dizer que eu mudei.
Abro minha mente para novas possibilidades e me abstenho de preconceitos. Curtindo o som ou não, sendo culturalmente enriquecedor ou não, sendo som para maloqueiro ou não, seja qual for a sua opinião (acredite, ela provavelmente seja bem parecida com a que eu tinha antes), é necessário que se observe.
Música é questão de gosto, assim como qualquer arte, e, sendo questão de gosto, não agradará à gregos e troianos, por isso temos tantos críticos de arte por aí. E antes que você diga: “Mas este rock do asfalto, totalmente sem conteúdo, não é arte”, pare e pense sobre o que você anda ouvindo ultimamente, será que é verdadeiro, ou você está apenas enriquecendo ainda mais a indústria fonográfica? Ou ainda, você, provavelmente, diga: “Boa música é MPB. É Tom, Elis é Chico Buarque...”.
Ok. Concordo, e em hipótese alguma desmereço. Mas é extremamente necessário que se tenha consciência de que a música POP está aí e é tão brasileira quanto a MPB, e, muito provavelmente, mais ouvida. E se traz verdade, se tem identidade, fé no que se faz e no que se tem a dizer, então, merece nosso crédito. Ou, no mínimo, respeito.
Quanto ao que eu aprendi, os estilos populares também podem ser libertadores:

O que vale nessa vida é o que se vive é o que se faz
Mas o que pode se esperar de uma pessoa que não pode
sonhar?
Como ele pode ter o que dele está tão longe?
Na vitrine coisas que ele nunca vai poder ter
Se ninguém o ajudar o que ele vai fazer?
Onde vai morar e o que vai ser quando crescer?
Quando vem da rua,
que é sua, que é minha, que é de ninguém
É tudo uma ilusão e você sabe muito bem
Impunidade, hipocrisia, dançam de mãos dadas
O hino nacional de uma nação condenada
A sociedade prega o bem
Mas o sistema só alimenta o que é mal
Se a nossa cara é prosperar,
o povo tem que evoluir também
Quase de manhã, mais uma noite no vazio
me auto-desafio, lá fora o mundo louco
sem perdão nem compaixão
A combustão em rota de colisão
A sinfonia da destruição
Vivendo o sonho e também o pesadelo
Vendo o mundo regredindo entre a fé e o dinheiro
Saudades do meu pai e dos amigos que morreram
Mas o que o velho me ensinou eu jamais me esqueço
Seja lá como for, na vida tudo tem seu preço
No mundo, o falso e o verdadeiro se confundem
Mas os que sabem jamais se iludem
Não é fácil encontrar o caminho
Mas é bom olhar pro lado e ver que não estou sozinho...
Todo o mal que é dirigido a nós
Nos fortalece e eu não vou desistir
(O que vale nessa vida é o que se vive é o que se faz)
Nas armadilhas que eu cai
Eu fiquei só e ninguém viu
(O que vale nessa vida é o que se vive é o que se faz)
O que pode se esperar de um ser humano perdido?
Que ele viva como se nunca fosse morrer?
Ou que ele morra como se nunca tivesse vivido?
O que pode se esperar de uma pessoa que não pode
sonhar?

I wanna think about tomorrow
'Cause tomorrow I want to be with you
Don't wanna live in quite sorrow
But that's the way the world will follow
It's all in my mind
Just wanna be myself for sometimes
Just wanna be myself

Acostumado desde cedo com a desgraça
em temporada de caça, um subnutrido
vítima da farsa, se formou na escola do crime
hoje o oprimido é quem oprimi
Uma alma carregada de ódio e amor
Mas muito mais ódio que amor
O aluno é também o professor
que ensina qualquer um que não sabe dar valor
à vida que tem ou à casa que mora
que vive sorrindo enquanto ele chora
Só mais um de milhares que se espalham
vítima dos nossos governantes que falharam
Todo o mal que é dirigido a nós
Nos fortalece e eu não vou desistir
(O que vale nessa vida é o que se vive é o que se faz)
Nas armadilhas que eu cai
Eu fiquei só e ninguém viu
(O que vale nessa vida é o que se vive é o que se faz)

I just wanna be myself...
Yeah! Yeah! Play your position
'Cause the world does the man
Little kids visions
May my sins be forgiven
Gotta have faith so
You can do what you wanna do
Gotta be this way So don't fool
'Cause the world is Cruel
Live by the sword, then you die by the sword
When I'm asking for peace in the middle of a war
Between blacks and whites, between rich and poor
So we can stop the mess overseas and all

Trabalho muito, vivo a vida, skateboard estilo de vida
um brilho intenso e a humildade de uma mente evoluída.

(Be Myself, Chorão e Thiago Castanho)






sexta-feira, 18 de julho de 2008

Medíocre



À Rafael Nunes, o poeta anônimo


Eu sou poética demais
Para gostar do concreto
Números são (exatos) demais
Enquanto palavras são (imprecisas) de menos
Eu sou sentimental demais
Para compreender a lógica
Não há espaço para filosofia
Quando o coração está repleto.
Prefiro pensar com o coração
Limito-me a isso
Assim como minha poesia é limitada,
Pois meu ser é simples
Simples existência sem razão
Em meio à multidão sem chão,
Correndo às voltas (sem intenção), na imensidão
Multidão, sem expressão
Presa a mais números (o que já são).
As horas passam... Apenas unidades de medida.
Eles te controlam.
Vida?
É esta a vida que temos.
E nada mais.
Nunca devo ter problemas com o tempo
Aquilo que dita o que você é: Seu saldo bancário
Quantos diplomas você tem?
Quantas horas - extra trabalhou?
Estes são os registros gerais da ignorância humana
Que classificam pessoas com código de barras
Não admito ser mais 1 número
Que ironia, já sou
Nasci em seis do quatro
e ganhei uma certidão por isso
Tornar-se-á o registro um arquivo
E estes números, pó,
No fim.
Por ora, dedico - me a ser quem sou
E a fazer o que faço.
Fui inspirada (a escrever) por um poeta anônimo
Mais um Zé - Ninguém falando para ninguém ouvir
Ele nem se quer tem idade para votar
Mas é muito mais gente do que muita gente grande por aí.
Talvez eu não devesse fazer o que faço
Mas sempre que tento fugir,
sou levada, forçada a continuar...
e gosto!
Pronto
Admiti.
Assinei a minha condenação,
Não vou mais negar, não quero mais mentir
Sou uma pessoa de palavra
E confesso
Respiro poesia, durmo poesia, almoço poesia
Vivo poesia
E isto é tudo o que importa para mim, neste momento
São estas raízes
São as raízes de minha vil existência cravadas
na abstratez das palavras.


*Escrito em Novembro de 2007

quarta-feira, 16 de julho de 2008

[ ]



- Pry, você tem alguma coisa pra fazer no intervalo?
- Não nada.
- É que faz tanto tempo que a gente não conversa...
- É verdade.
- Eu sinto tanta falta dos nossos “papos furados”, Pry!
- Eu também.
- Podemos passar o intervalo juntas então?
- Claro que sim, vai ser ótimo!
*

- Então, Pry, é isso que está acontecendo.
- Vixi, Marina! Nem sei o que dizer, eu sempre achei esse menino muito estranho, você sabe.
- Aiiii, Pry... calma que ele tá vindo aí.
- Ahahaha, essa é boa! Quem tem que ficar calma é você!
- Oi linda!
- Oi Paulo. Esta é a Pry, minha amiga.
- Oi, tudo bem?
- Tudo.
- Nossa Má, o que você fez? Seus olhos estão diferentes.
- É a maquiagem.
- Tá lindo! Você deveria fazer sempre. Pensando bem, sempre não, só às vezes, pra mudar um pouco! Não acha?
- Acho, acho. – a Pry respondeu fazendo força para segurar o riso.
- Tá indo pra aula de quê?
- Matemática e você?
- Nem sei... que aula a gente tem agora, Pry?
- Num lembro.
- Putz é mesmo, eu tenho muita coisa para resolver antes da aula, melhor eu ir.
- Vai lá.
- Beijo.
*

- Ahahahahaha
- Que foi, Pry, tá rindo do quê?
- Ah, Má, você vai ter que me desculpar, mas é ridículo!
- Ah, que bom! Agora você tá caçoando de mim!
- Não é de você.
- Do que é então?
- Dos dois.
- Eu pensei que você fosse minha amiga, além de rir de mim, também tá rindo do Paulo, por acaso não acabei de te contar que estou apaixonada por ele?
- Eu sei, Marina, por isso que pedi desculpa, mas tenho que ser sincera...
- ...
- A forma como vocês dois agem um com o outro é, no mínimo, estranha: vocês travam!
- Achei que fosse só eu. Então você acha que ele também fica sem saber o que dizer na minha presença?
- Você deve estar brincando... “devia fazer isso sempre, ou melhor, só de vez em quando pra mudar um pouco, não acha?” ele parecia mais um consultor de moda!
- Ah, Pry, não brinca assim não.
- Não estou brincando, ele perdeu totalmente a noção do ridículo com você!
- É uma relação estranha mesmo, eu tenho que admitir.
- Exatamente isso.


*Escrito em Agosto de 2006

P.S.:

  • Acaso: Conjunto de causas independentes entre si que, por leis ignoradas, determinam um acontecimento qualquer.

  • Destino: Sucessão de fatos que podem ou não ocorrer, e que constituem a vida do homem, considerados como resultantes de causas independentes de sua vontade.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Fiz um apanhado de antigos textos meus, os que eu julgar que vale a pena, postarei aqui nos próximos dias, as postagens referentes a estes textos levarão o marcador "textos antigos".
O pequeno conto a seguir foi escrito no segundo semestre de 2006.
***
(Des)encontro

- Ops... Desculpa... Ah! Oi tudo bem? Não vi que era você...
- Tudo bem, e com você?
- Tudo.
- Quanto tempo! O que anda fazendo da vida?
- Nada de mais, só o de sempre!
- Saudade...
- Também estava.
- Você está linda como sempre!
Eu tremia como que em febre, quando ouvi esta frase meu coração disparou... senti um calafrio, meus pés saíram do chão... seus dedos tocaram meu rosto, eu estava imóvel, ele colocou meu cabelo, que caía displicentemente pela face, atrás da orelha...
- Imagina! São seus olhos.
Eu estava mais atrasada do que antes, subi as escadas correndo, com o coração batendo ainda mais rápido, cheguei na sala, abri a porta ofegante:
- Professora, posso entrar?
- Atrasada de novo? Pode entrar, mas vai ficar com falta nesta aula.
- Tudo bem professora, prometo que não vai mais acontecer!
Eu fiz tal promessa sabendo que não iria conseguir cumprir, sempre tive problemas com os meus horários, não por falta de responsabilidade, mas porque o tempo é algo que sempre fugiu ao meu controle, algo muito influente que eu nunca entendi direito.
Mas eu não estava preocupada com promessa nenhuma, nem com aula nenhuma, naquele momento eu só conseguia pensar em uma coisa: aquela boca que há pouco esteve tão perto da minha...
- O que aconteceu Marina? Você está pálida!
- Você não vai acreditar...
- O que o Paulinho fez desta vez?
- Ah não, Pry, eu sou tão transparente assim?
- A verdade?
- ...
- É!

sexta-feira, 11 de julho de 2008

O amor é uma força da natureza.


Passados mais de dois anos de sua estréia nos cinemas nacionais, assisti, na última sexta-feira, ao filme, do cineasta taiwanês Ang Lee, “O Segredo de Brokeback Mountain” (2005), como foi chamado no Brasil.
Longe de ser um clássico, o filme, para a redenção de Ang Lee, está ainda mais longe de se encaixar nos moldes do entretenimento de massa, como foi Hulk, uma das últimas produções do diretor.
Para quem procura ação, com certeza, eu não recomendaria Brokeback. Há quem diga que seu roteiro é “arrastado”, a meu ver, este “marasmo” é uma estratégia inteligente e indispensável ao desenvolvimento do enredo. Brokeback é, ao contrário, um filme emotivo.
A produção recebeu oito indicações ao oscar, incluindo melhor filme, sendo considerado o favorito a vencer nessa categoria (não que isto seja de extrema relevância para mim, mas o oscar é sempre uma referência, se este é um fator positivo ou não, já é outra história).
Mas para o desapontamento da crítica, Brokeback não levou a estatueta, senão pela direção de Ang Lee, cabe dizer que, este foi o primeiro oscar do cineasta. Além da categoria “melhor diretor”, o filme levou mais duas estatuetas: Melhor roteiro adaptado e melhor trilha sonora original, sem contar inúmeras premiações em eventos estrangeiros.
Confesso que nada disso importou quando fiz a escolha do filme: foi totalmente ao acaso e à seco; não li a sinopse, apenas aluguei.
Mencionei este detalhe porque o considero indispensável para a minha posterior impressão, na qual é fundamentada toda esta crítica.
As belas paisagens montanhosas do Estado de Wyoming, no meio-oeste americano e do, também interiorano, Texas, foram o cenário utilizado para trazer às telas a controversa e polêmica temática da homossexualidade.
Brokeback é baseado no conto homônimo da jornalista e escritora americana Annie Proulx e conta a história de Ennis Del Mar e Jack Twist, dois jovens cowboys que se conhecem durante um emprego temporário no verão de 1963.
Isolados do mundo no alto da Montanha Brokeback, e tendo como companhia apenas dois cavalos, cães e o rebanho de ovelhas que foram contratados para proteger, os diálogos entre os personagens centrais são sempre bastante densos, o que faz com que cresça, de forma hiper sutil, uma amizade e um companheirismo instintivo e conflituoso que culmina, surpreendentemente, num urgente encontro sexual entre os dois.
O roteiro, igualmente perturbado, parece seguir à risca o estado de humor dos personagens, que, mesmo apaixonados, são obrigados a seguir caminhos diferentes.
Embora a sutileza seja a marca registrada nas relações entre os personagens, e, de fato, há um clima de tensão do primeiro ao último minuto, o que dá charme à Brokeback é justamente o contraste dado pelas atitudes sempre tão extremadas dos personagens, após longos períodos de repressão dos sentimentos.
O grande trunfo da obra-prima de Ang Lee, além das brilhantes atuações do falecido ator australiano Heath Ledger e do americano Jake Gyllenhaal, é, sem dúvida, a sensibilidade e a concisão com que o enredo se desenvolve.
O filme é todo uma grande surpresa, a começar por se tratar da história de amor entre dois cowboys, o que, de certa forma, subverte a antiga imagem de homens machões que se tem dos cowboys desde os antigos westerns.
E realmente, até a primeira cena de sexo do filme, o que menos se imagina é que eles sejam gays, na realidade, é necessário que se enfatize, nem os próprios sabiam disso.
Brokeback é um filme de poucas palavras e repleto de sentidos implícitos.
E, aproveitando-se desta atmosfera silenciosa, dispara um tiro certeiro que atinge paradigmas sociais complexos. Com um roteiro provocante, o filme levanta questões difíceis, tocando também em profundos e delicados princípios individuais, e se não exagero, desequilibrando padrões de pensamento, leva os espectadores a rever certos conceitos. E a questão vai muito além do preconceito e da homofobia.
O Segredo de Brokeback Mountain é, antes de mais nada, um filme sobre amor.
E se o amor é mesmo uma força da natureza (como são os instintos); se amar não se aprende, não se renega, apenas se ama, então Brokeback talvez seja uma das obras que trouxe com mais propriedade a temática do amor enquanto tal, na história do cinema. Isto, claro, na minha leiga e humilde opinião.
Quanto ao medo e aos opostos, este duelo impregnado na atmosfera do filme vem ilustrando o que, a meu ver, caracteriza o grande dilema humano:
Arriscar-se à felicidade ou passar a vida se escondendo?
Ennis Del Mar e Jack Twist fizeram suas escolhas. E o final é óbvio, mas ainda assim, surpreendente (e também neste sentido a arte imita a vida), como não poderia deixar de ser.




Leia o conto de Annie Proulx na íntegra.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Alusão à Clarice



O trecho que se segue é um fragmento da obra, de Clarice Lispector, “A hora da estrela” e entre todos os seus significados para mim, três deles merecem destaque.
Primeiro: é Clarice e isto já fala por si só.
Segundo: é A hora da estrela, o último grito da autora. Sou suspeita em dizer, visto a marca que este texto deixou em mim, que esta talvez seja a melhor obra da pessoa que soube, como ninguém, traduzir em palavras o universo feminino. Cada uma dessas tão genialmente traçadas linhas, falam diretamente à alma, à minha alma. E creio que também a todos aqueles que apreciam as formas de expressão da arte, seja ela qual for.
E terceiro: Esta parte introdutória do livro foi adaptada para o teatro por uma grande amiga, Juliana Gregolin, para uma peça intitulada "Quimera", da qual eu tive a honra de ser co-roteirista e a última da Companhia de Artes Salada Mista, da qual, orgulhosamente, fui membro por três anos.
Dedico este cantinho do meu blog aos meus queridos amigos, colegas de sala e companheiros de grupo.
Nós tivemos a sorte de ser etianos e mais do que isto, de termos uns aos outros.
Aos quinze, éramos jovens engajados e, por um objetivo em comum, nos unimos numa parceria que durou até o fim do Ensino Médio.
O terceiro H fez história. Quem dera que todos aproveitassem as oportunidades que a vida nos dá, como nós fizemos...
Hoje somos "gente grande", seguimos nosso caminho, alguns na faculdade, alguns trabalhando, mas cada qual com seu projeto particular de vida. Mas sabe, essa parceria não durou, como eu disse, apenas três anos, há um pedacinho de cada um marcado para sempre no outro.
E quem sabe não haja mesmo a reapresentação, que tanto queríamos, em agosto?
Mesmo com algumas pessoas longe, o coração carrega, ainda, o sentimento do mundo.

“Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida. Mas antes da pré-história havia a pré-história da pré-história e havia o nunca e havia o sim. Sempre houve. Não sei o quê, mas sei que o universo jamais começou.
Que ninguém se engane, só consigo a simplicidade através de muito trabalho.
Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever. Como começar pelo início, se as coisas acontecem antes de acontecer? Se antes da pré-pré história já havia monstros apocalípticos? Se esta história não existe, passará a existir. Pensar é um ato. Sentir é um fato. Os dois juntos – sou eu que escrevo o que estou escrevendo. Deus é o mundo. A verdade é sempre um contato interior e inexplicável. A minha vida a mais verdadeira é irreconhecível, extremamente interior e não tem uma só palavra que a signifique. Meu coração se esvaziou de todo desejo e reduz-se ao próprio último ou primeiro pulsar. A dor de dentes que perpassa essa história deu uma fisgada funda em plena boca nossa. Então eu canto alto agudo uma melodia sincopada e estridente – é a minha própria dor, eu que carrego o mundo e a falta de felicidade. Felicidade? Nunca vi palavra mais doida [...]”



* Veja a lista de links ao lado, na seção: “... e nasceu uma grande parceria”.

terça-feira, 24 de junho de 2008

Identidade


Às queridas Helô e Evanda, pelas visitas ao circo, ao museu e, principalmente, pela companhia neste semestre

"[...] Penetra surdamente no reino das palavras. Lá estão os poemas que esperam ser escritos. Estão paralisados, mas não há desespero há calma e frescura na superfície intacta. Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário. Convive com teus poemas, antes de escrevê-los. Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam. Espera que cada um se realize e consuma com seu poder de palavra e seu poder de silêncio [...]"


***

Ouve sem ouvir, está dentro.
Chiu! Cala! Ouve.
Fala, mas sem dizer nada.
Pensa.
Este emaranhado aí dentro é você (que grita)!
Senta e lê Drummond.
Penetra. Pensa.
Está aí. Em você.
Põe pra fora.
Escreva.
Diga
O que quiser.
Deixa sair o som.
Trace as linhas.
Não precisa,
apenas
pensa!
Guarda.
Esta marca vem do ventre materno.
E a pele tatuada atravessa o tempo
Enruga,
recria as figuras em si.
Com a tinta mais colorida, pinta todos os berros do mundo
Todas as canções
Todas as poesias
Deixando o rastro das cores
não na pele do homem, mas na epiderme da Terra.
Circula pela corrente sangüínea.
Ele cala.
Mas sua voz ecoa
eternamente
mente...
mente...
mente.
Mas não continua estática.
Modula, modelo, modela.
Neologismo.
E estes novantigos fonemas desconexos
Saltam, se beijam.
São seres.
A possessão.
Veja como elas te possuem
Aliás, vocês possuem-se mutuamente.
Pára e contempla esta maravilhosa
Inversão de papéis:
Ela penetra você.
Acintosamente sopra desconhecidos símbolos em seu ouvido.
Mascara-se, transforma-se.
Te seduz...
e te provoca.
Fecha o livro.
Atordoado de sentido.
Senta para não cair.
E procura a chave.
Palavra s.f. 1. Fonema ou grupo de fonemas com uma significação; termo, vocábulo.
2. Sua representação gráfica. 3. Manifestação verbal ou escrita. 4. Faculdade de expressar idéias por meio de sons articulados, fala. 5. Modo de falar.
Questiona o Aurélio
retoricamente.
Será?

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Existência Extraterrestre


O que o ser humano mais aspira é tornar-se um ser humano.
Clarice Lispector


Marcianos invadem a Terra.
São os marcianos que invadem,
Ou nós que somos os marcianos na Terra?
Por que olho no espelho
E não me reconheço mais?
Sou a sombra do que fui um dia
Ou estou me tornando uma pessoa?
Toca Raul.
Eu sou uma metamorfose ambulante
E isso assusta.
Quando foi que aconteceu?

Quando?
Fui abduzida pelos extraterrestres da Terra
E eles alimentam-me
De uma imundície
Que me embrulha o estômago,

Prejudica-me a saúde.
Estamos todos à mercê deles,
Estamos à mercê de nós mesmos.
Porque somos assim
E aceitamos sê-lo!
Continuo em mutação.
Metamorfose ambulante.
Não quero me tornar um deles:
Capturar a sua alma
E manipular o seu cérebro,
Controlar os frágeis, iguais a mim;
Impor as minhas leis.
Matar a esmo,
E rir sobre o sangue em minhas mãos.
E o espírito num frasco.
Não faça chorar.
Jogue, mas não sem antes examinar:
O bumerangue sempre volta pra você.
Quisera eu viver em Marte!
Pego minha nave espacial
E me mudo para lá.
Quem sabe, eu encontre vida em Marte.
Quem sabe (?)

Encontre gente.
E sorrisos menos pérfidos
E vidas menos oprimidas
E almas menos segregadas...



*Escrito em Janeiro de 2008*

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Na Contramão

“Devemos constantemente mudar nossa visão. Quando você acredita que sabe uma coisa, deve olhar sob outro prisma. Quando ler, não considere apenas a visão do autor, considere o que você pensa. Você deve encontrar sua própria voz, quanto mais demorar a começar, menos chance terá de encontrá-la em plenitude.”

Robim Williams em Dead Poets Society.
**
Não apenas pela homenagem ao compositor, até porque esta letra vai muito além, aliás, não é segredo pra ninguém esta minha paixão, já antiga, pelo Renato Russo e todo o fruto de sua obra que contrbuiu (e muito) para o modo de pensar de tantas Legiões de jovens (do passado, presente e futuro).
Não é apenas porque me identifico ou porque choro ouvindo a letra ou porque meu coração, descompassado, acompanha o descompasso da música (e do mundo).
Não é apenas pelo tanto que tenho aprendido (e que todos estão carecas de saber), não só pelos dias estudando sobre a "Reificação Humana" , ou porque me cheira a trabalho bem-feito, em dose dupla.
Também não pensem que quero pregar a minha verdade para todos que lerem este post, estou consciente da hipocrisia da qual, no entanto, sou fruto.
Não quero reproduzir esta oração.
Não quero (apenas) dizer "amém" no final
Palavras repetidas?
Mas quais são as palavras que nunca são ditas?
Algumas, simplesmente, precisam ser repetidas, quantas vezes for necessário
Portanto (e enquanto não encontro outra saída) faço minhas as palavras do Pensador, a partir de agora:
A Terra tá soterrada de violência
de guerra, de sofrimento, de desespero
a gente tá vendo tudo, tá vendo a gente
tá vendo, no nosso espelho, na nossa frente
tá vendo, na nossa frente, aberração
tá vendo, tá sendo visto, querendo ou não
tá vendo, no fim do túnel, escuridão
tá vendo no fim do túnel escuridão
tá vendo a nossa morte anunciada
tá vendo a nossa vida valendo nada
tô vendo, chovendo sangue no meu jardim
tá lindo o sol caindo, que nem granada
tá vindo um carro-bomba na contramão
tá vindo um carro-bomba na contramão
tá vindo um carro-bomba na contramão
tá rindo o suicida na direção
**
A bomba tá explodindo na nossa mão
o medo tá estampado na nossa cara
o erro tá confirmado, tá tudo errado
o jogo dos sete erros, que nunca pára 7, 8, 9, 10... cem
erros meus, erros seus e de Deus também
estupidez, um erro simplório
a bola da vez, enterro, velório
perda total, por todos os lados
do banco do ônibus ao carro importado
teu filho morreu? meu filho também
morreu assaltando, morreu assaltado
tristeza, saudade, por todos os lados
tortura covarde, humilha e destrói
eu vejo um Bin Laden em cada favela
herói da miséria, vilão exemplar
tortura covarde, por todos os lados
tristeza, saudade, humilha e destrói
as balas invadem a minha janela
eu tava dormindo, tentando sonhar
Sou um grão de areia no olho do furacão
em meio a milhões de grãos
cada um na sua busca, cada bússola num coração
cada um lê de uma forma o mesmo ponto de interrogação
nem sempre se pode ter fé
quando o chão desaparece embaixo do seu pé
acreditando na chance de ser feliz
eterna cicatriz
eterno aprendiz das escolhas que fiz
sem amor, eu nada seria
ainda que eu falasse a língua de todas as etnias
de todas as falanges, e facções
ainda que eu gritasse o grito de todas as Legiões
palavras repetidas
mas quais são as palavras que eu mais quero repetir na vida?
Felicidade, Paz, é...
Felicidade, Paz, Sorte
nem sempre se pode ter Fé,
mas nem sempre a fraqueza que se sente quer dizer que a gente não é forte.
"É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã
porque se você parar pra pensar na verdade não há"